segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Quanta verdade neste texto.


Você é "Hands On" ?
Max Gehringer / Colunista da Revista EXAME

Vi um anúncio de emprego. A vaga era de Gestor de
Atendimento Interno, nome que agora se dá à Seção de
Serviços Gerais. E a empresa exigia que os interessados
possuíssem - sem contar a formação superior - liderança,
criatividade, energia, ambição, conhecimentos de
informática, fluência em inglês e não bastasse tudo
isso, ainda fossem HANDS ON. Para o felizardo que
conseguisse convencer o entrevistador de que possuía essa
variada gama de habilidades, o salário era um assombro: 800
reais. Ou seja, um pitico.
Não que esse fosse algum exemplo fora da realidade. Ao
contrário, é quase o paradigma dos anúncios de emprego. A
abundância de candidatos permite que as empresas levantem
cada vez mais a altura da barra que o postulante terá de
saltar para ser admitido.
E muitos, de fato, saltam. E se empolgam. E aí vêm as
agruras da super-qualificação, que é uma espécie do lado
avesso do efeito pitico...
Vamos supor que, após uma duríssima competição com
outros candidatos tão bem preparados quanto ela, a Fabiana
conseguisse ser admitida como gestora de atendimento
interno... E um de seus primeiros clientes fosse o seu
Borges, Gerente da Contabilidade.

Seu Borges: -- Fabiana, eu quero três cópias deste
relatório.
Fabiana: -- In a hurry!
Seu Borges: -- Saúde.
Fabiana: -- Não, Seu Borges, isso quer dizer "bem
rapidinho". É que eu tenho fluência em inglês.
Aliás, desculpe perguntar, mas por que a empresa exige
fluência em inglês se aqui só se fala português?
Seu Borges: -- E eu sei lá? Dá para você tirar logo as
cópias?
Fabiana: -- O senhor não prefere que eu digitalize o
relatório? Porque eu tenho profundos conhecimentos de
informática.
Seu Borges: -- Não, não.. Cópias normais mesmo.
Fabiana: -- Certo. Mas eu não poderia deixar de mencionar
minha criatividade. Eu já comecei a desenvolver um projeto
pessoal visando eliminar 30% das cópias que tiramos.
Seu Borges: -- Fabiana, desse jeito não vai dar!
Fabiana: -- E eu não sei? Preciso urgentemente de uma
auxiliar.
Seu Borges: -- Como assim?
Fabiana: -- É que eu sou líder, e não tenho ninguém
para liderar. E considero isso um desperdício do meu
potencial energético.
Seu Borges: -- Olha, neste momento, eu só preciso das
três cópias.
Fabiana: -- Com certeza. Mas antes vamos discutir meu
futuro...
Seu Borges: -- Futuro? Que futuro?
Fabiana: -- É que eu sou ambiciosa. Já faz dois dias que
eu estou aqui e ainda não aconteceu nada.
Seu Borges: -- Fabiana, eu estou aqui há 18 anos e também
não me aconteceu nada!
Fabiana: -- Sei. Mas o senhor é hands on?
Seu Borges: -- Hã?
Fabiana: -- Hands on.....Mão na massa.
Seu Borges: -- Claro que sou!
Fabiana: -- Então o senhor mesmo tira as cópias. E agora
com licença que eu vou sair por aí explorando minhas
potencialidades. Foi o que me prometeram quando eu fui
contratada.

Então, o mercado de trabalho está ficando dividido em
duas facções:
1 - Uma, cada vez maior, é a dos que não conseguem boas
vagas porque não têm as qualificações requeridas.
2 - E o outro grupo, pequeno, mas crescente, é o dos que
são admitidos porque possuem todas as competências
exigidas nos anúncios, mas não poderão usar nem metade
delas, porque, no fundo, a função não precisava delas.
Alguém ponderará - com justa razão - que a empresa está
de olho no longo prazo: sendo portador de tantos talentos, o
funcionário poderá ir sendo preparado para assumir
responsabilidades cada vez maiores.
Em uma empresa em que trabalhei, nós caímos nessa
armadilha. Admitimos um montão de gente superqualificada. E
as conversas ficaram de tão alto nível que um visitante
desavisado confundiria nossa salinha do café com a
Fundação Alfred Nobel..
Pessoas superqualificadas não resolvem simples problemas!
Um dia um grupo de marketing e finanças foi visitar uma de
nossas fábricas e no meio da estrada, a van da empresa
pifou. Como isso foi antes do advento do milagre do celular,
o jeito era confiar no especialista, o Cleto, motorista da
van. E aí todos descobriram que o Cleto falava inglês,
tinha informática e energia e criatividade e estava fazendo
pós-graduação... só que não sabia nem abrir o capô.
Duas horas depois, quando o pessoal ainda estava tentando
destrinchar o manual do proprietário, passou um sujeito de
bicicleta. Para horror de todos, ele falava "nóis
vai" e coisas do gênero. Mas, em 2 minutos, para
espanto geral, botou a van para funcionar. Deram-lhe uns
trocados, e ele foi embora feliz da vida.

- Aquele ciclista anônimo era o protótipo do funcionário
para quem as Empresas modernas torcem o nariz:
O QUE É CAPAZ DE RESOLVER, MAS NÃO DE IMPRESSIONAR.

(Max Gehringer)




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3 comentários:

maybe disse...

I'm appreciate your writing skill.Please keep on working hard.^^

Anônimo disse...

Nossa, posso dizer que tudo o que foi dito é a mais pura reaqlidade. Estou há alguns meses desempregado e apesar de ter Inglês, cursos universitário, conhecer bem informática sou chamado apenas para trabalhar em call centers. Para as empresas eu não sirvo para trabalhar em um escritório.

Deepblueyes disse...

Gostei muito deste texto.
E sim, ele mostra como realmente o mercado age e o que podemos esperar dele.